O VISIONÁRIO DE AVATAR
O cineasta diz que a sequência do filme de maior
faturamento da história mostrará a necessidade de
encontrar um equilíbrio entre desenvolvimento e meio ambiente.
O cineasta canadense James Cameron, de 55 anos, é o criador de alguns dos maiores sucessos do
cinema, como O Exterminador do Futuro, Aliens, Titanic e, recentemente, Avatar, uma produção de mais de
300 milhões de dólares que ultrapassou a marca de 2 bilhões de dólares de faturamento em venda de
ingressos. Cameron planeja dar sequência a Avatar. Profeta da tecnologia aplicada ao cinema e dono de um
dom quase infalível para saber o que fará sucesso entre os espectadores, Cameron também tenta ser um
visionário do meio ambiente. Ele esteve no mês passado no Brasil para participar, em Manaus, do Fórum
Internacional de Sustentabilidade, realizado pela Seminars e promovido pelo Lide. Aproveitou a ocasião
para sobrevoar pela primeira vez a Floresta Amazônica e conhecer a região onde será construída a Usina
Hidrelétrica de Belo Monte, no Xingu. Após a visita, decidiu organizar uma campanha internacional contra
a usina. Cameron concedeu a seguinte entrevista a VEJA:
Qual foi sua motivação para filmar Avatar?
O filme surgiu da minha necessidade de dizer algo sobre
como a destruição da natureza ameaça o mundo. Gosto de comparar a questão ambiental com o naufrágio
do Titanic. Quando foi dado o aviso de que havia um iceberg na rota do navio, não dava mais tempo de
desviar. O impacto ocorreu noventa segundos após o sino de alerta ter sido tocado. A questão é: o mundo já
se encontra no estágio em que nada mais pode ser feito para evitar o desastre ambiental? Ou estamos em um
momento anterior, em que ainda dá tempo de reduzir o ritmo de poluição e de destruição para evitar o pior?
Avatar é a minha maneira, como artista e cineasta, de tocar o sino de alerta. Uma das imagens recorrentes
em Avatar é a dos personagens abrindo os olhos. Há sempre alguém acordando no filme. A mensagem
subliminar é que a sociedade precisa acordar para os problemas ambientais e lidar com eles.
Avatar valoriza experiências sensoriais como entrar em uma floresta cheia de flores coloridas ou
sentir a terra sob os pés nus.
A humanidade esqueceu como apreciar essas sensações?
Sim. As pessoas
estão se afastando não apenas da natureza, mas do contato humano. Os jovens têm as suas interações sociais
on-line, em vez de pessoalmente. As aventuras acontecem em jogos de computador, não mais fora de casa.
A interação com a realidade, com outras pessoas e com a natureza está diminuindo. A tecnologia permite
isso.
O senhor, contudo, é o diretor de cinema que mais usa tecnologia no mundo. Como explicar esse
paradoxo?
De fato, é um paradoxo. Eu sempre tive uma relação de amor e ódio com a tecnologia. Durante as filmagens
de Avatar, os atores tiveram de entrar em contato com o lado mais primitivo de si próprios e, ao mesmo
tempo, atuar nas condições mais high-tech possíveis. Para dar uma ideia da tecnologia envolvida, este foi o
primeiro filme a demandar uma memória de 1 petabyte (1 milhão de gigabytes) para ser armazenado. Para
processar as imagens digitais, na Nova Zelândia, tivemos de desenvolver o computador mais potente do
Hemisfério Sul. Ou seja, não podemos ser ludistas e afirmar que toda tecnologia é ruim. A solução para
salvar nosso planeta também passa pelo uso da tecnologia. Por isso, penso que, antes de construir uma
hidrelétrica como a de Belo Monte, no Pará, por exemplo, o governo brasileiro poderia buscar outras saídas
para atender à necessidade de energia do país. Todo projeto de represa com um impacto negativo sobre os
moradores da região deveria ser evitado. A alternativa, no nível nacional, pode ser aumentar a eficiência no
uso de energia nas cidades.
Na construção de um projeto como o de Belo Monte há duas forças legítimas em conflito: o
desenvolvimento econômico e a defesa do ambiente. É possível conciliar os dois, desde que se encontre
um meio-termo. Em Avatar não existe o meio-termo. Por quê?
A explicação é simples: a solução
moderada provavelmente não é a melhor solução. Imagine um caçador sufocando um animal aos poucos.
Ele aperta o seu pescoço, depois solta só um pouquinho — e assim sucessivamente até que o animal para de respirar. Quando a civilização bate de frente com a natureza, não dá para ter meio-termo. Ou o governo
constrói a represa de Belo Monte, ou não a constrói.
Em Avatar 2, o meio-termo entre economia e meio ambiente será encontrado?
Sim. O próximo filme não deverá ser tão preto no branco quanto o primeiro. Durante uma projeção de
Avatar no Equador, a anciã de uma tribo indígena criticou o filme por escolher a violência como solução
para o conflito ambiental. Por isso, pretendo mostrar, na continuação da obra, que as partes têm de chegar a
um acordo. Outras questões a que Avatar 2 e, talvez, Avatar 3 precisam responder: a humanidade pode ser
salva? O modo de vida dos Na'vi (o povo azul que habita Pandora, a lua fictícia do filme) pode transformar
o planeta Terra ou estamos condenados? Os seres humanos serão capazes de absorver as ideias poderosas de
Pandora e aplicá-las à própria vida, de maneira a recuperar tudo o que perderam? Em outras palavras, os
Na'vi podem ter uma mensagem de esperança para nós, terráqueos? O primeiro Avatar é apenas o tiro
inaugural de uma gigantesca batalha de ideias e civilizações.
Diogo Schelp
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