quarta-feira, 25 de maio de 2011

Quem sou como professora...

Antes de tudo gostaria de pontuar que a convivência com alunos e professores servem de espelho para a minha contínua formação como educadora porque, mesmo sem o saber, eles concedem a mim a honra de compartilhar dos seus saberes.  São meus mestres, meus exemplos... Tão importantes e especiais... Seus peculiares modos de ser me fazem aprender sobre o familiar, sobre o exótico, sobre a escola, sobre a rua, sobre a amizade, sobre a educação e sobre a virtude... É, ainda, a linha melódica de um autêntico e genuíno aprendizado do ensino com amor... Agradeço silenciosamente a eles por serem grafiteiros da minha razão.
Trazer a Geografia para a vida dos alunos é, ao meu ver, a melhor forma de ensiná-la. Deve-se fugir um pouco dos livros didáticos, mostrando-lhes (quando não o percebem), que eles fazem geografia no seu dia-a-dia, no caminho para a escola, para o trabalho, para o lazer, ou seja, em suas diversas atividades diárias.
                 A relevância do papel do professor, situando-o como sujeito – real, concreto – de um fazer docente, no que esta guarda de complexidade, importância social e especificidade, inclui dar-lhe a voz que precisa ter na produção de conhecimento sobre sua prática e mantê-lo no processo constante de formação continuada, para que possam dar conta, no seu cotidiano profissional, das mudanças substantivas e plurais que ocorrem em escala planetária, numa velocidade cada vez maior, neste início de século. Devemos conceber o ensino em uma perspectiva multidisciplinar, considerando que nos tempos e espaços atuais é fundamental que se pense a Educação de maneira integrada e não-fragmentada o que, infelizmente, ainda acaba por acontecer nas formações gerais de muitos professores, nas universidades brasileiras.

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Saímos da Idade Média?

Continuamos a ser medievais, somente com mais tecnologia... só isso!


Em meados do século passado, muito se falou em modernismo - movimento que se baseou na ideia de que as formas "tradicionais" das artes plásticas, literatura, design, organização social e da vida cotidiana tornaram-se ultrapassadas. Assim, se fazia fundamental deixá-las de lado e criar no lugar uma nova cultura, onde a ideia de reexaminar cada aspecto da existência humana na Terra, do comércio à filosofia, teria o objetivo de achar o que seriam as "marcas antigas" e substituí-las por novas formas, e possivelmente melhores, de se chegar ao "progresso".
Em essência, o movimento moderno argumentava que as novas realidades do século XX eram permanentes e eminentes, e que as pessoas deveriam se adaptar a suas visões de mundo a fim de aceitar que o que era novo era também bom e belo. Nem bem iniciamos o processo de nos tornarmos modernos e, na ligeireza que o mundo anda, da noite para o dia, já se falava em sermos pós-medernos.
A pós-modernidade, que é, segundo muitos estudiosos, a condição sócio-cultural e estética que prevalece no capitalismo contemporâneo após a queda do Muro de Berlim e a consequente crise das ideologias que dominaram o século XX. O uso do termo pós-modernide se tornou corrente, embora haja controvérsias quanto ao seu significado e a sua pertinência.
No meu ver, como já disse o antropólogo e filósofo, Bruno Latour, que defende a tese de que o homem, até mesmo aquele que se autodenomina pós-moderno, mal chegou a ser moderno: continuamos a ser os mesmos que éramos na Idade Média, bárbaros com uma pitada de tecnologia.
Quero dizer que, a sociedade humana, independente de ser ocidental ou oriental, continua sendo mística, preconceituosa, conservadora e intolerante. Para vivermos em um mundo melhor, talvez civilizado, temos de mudar muito.
Mas porque digo tudo isso, que ainda somos medievais?
Vejam bem: recentemente, beatificamos um Papa, casamos um príncipe e, numa cruzada épica, invadimos um território alheio e matamos um mouro.
E assim vamos indo... para onde mesmo?

domingo, 15 de maio de 2011

Sou professora. Profissão? Não, estilo de vida.

SOU PROFESSOR
Sou professor.
Nasci no momento exato em que uma pergunta saltou da
boca de uma criança.

Fui muitas pessoas em muitos lugares.

Sou Sócrates, estimulando a juventude de Atenas a descobrir novas idéias através de perguntas.

Sou Anne Sullivan, extraindo os segredos do universo da mão estendida de Helen Keller.

Sou Esopo e Hans Christian Andersen, revelando a verdade através de inúmeras histórias.

Sou Marva Collins, lutando pelo direito de toda a criança à Educação.

Sou Mary McCloud Bethune, construindo uma grande universidade para meu povo, utilizando caixotes de laranja como escrivaninhas.
Sou Bel Kauffman, lutando para colocar em  prática o Up Down Staircase.
Os nomes daqueles que praticaram minha profissão soam como um corredor da fama para a humanidade...
Booker T. Washington, Buda, Confúcio, Ralph Waldo Emerson, Leo Buscaglia, Moisés e Jesus.

Sou também aqueles cujos nomes foram há muito esquecidos, mas cujas lições e o caráter serão sempre lembrados nas realizações de seus alunos.
Tenho chorado de alegria nos casamentos de ex-alunos, gargalhado de júbilo no nascimento de seus filhos e permanecido com a cabeça baixa de pesar e confusão ao lado de suas sepulturas cavadas cedo demais,
para corpos jovens demais.

Ao longo de cada dia tenho sido solicitado como ator, amigo, enfermeiro e médico, treinador, descobridor de artigos perdidos, como o que empresta dinheiro, como motorista de táxi, psicólogo, pai substituto,
vendedor, político e mantenedor da fé.

A despeito de mapas, gráficos, fórmulas, verbos, histórias e livros, não tenho tido, na verdade, nada o que ensinar, pois meus alunos têm apenas a si próprios para aprender, e eu sei que é preciso o mundo
inteiro para dizer a alguém quem ele é.

Sou um paradoxo.
É quando falo alto que escuto mais.

Minhas maiores dádivas estão no que desejo receber  agradecido de meus alunos.
Riqueza material não é um dos meus objetivos, mas sou um caçador de tesouros em tempo integral, em minha busca de novas oportunidades para que  meus alunos usem seus talentos e em minha procura
constante desses talentos que, às vezes, permanecem encobertos pela autoderrota.

Sou o mais afortunado entre todos os que labutam.
A um médico é permitido conduzir a vida num mágico momento.
A mim, é permitido ver que a vida renasce a cada  dia com novas perguntas, idéias e amizades.
Um arquiteto sabe que, se construir com cuidado, sua estrutura poderá permanecer por séculos.
Um professor sabe que, se construir com amor e verdade, o que construir durará para sempre.
Sou um guerreiro, batalhando diariamente contra a pressão dos colegas, o negativismo, o medo, o conformismo, o preconceito, a ignorância e a apatia. Mas tenho grandes aliados: Inteligência, Curiosidade, Apoio paterno, Individualidade, Criatividade, Fé, Amor e Riso, todos correm a tomar meu partido com apoio indômito.(...)
E assim, tenho um passado rico em memórias.
Tenho um presente de desafios, aventuras e divertimento, porque a mim é permitido passar meus dias com o futuro.
Sou professor... e agradeço a Deus por isso todos os dias.  
John W. Schlatter

sábado, 14 de maio de 2011

Ler o Mundo

LER O MUNDO
(Affonso Romano de Sant’Anna)
Tudo é leitura. Tudo é decifração. Ou não. Depende de quem lê. [...]
Tudo é leitura. Tudo é decifração. Ou não. Ou não, porque nem sempre deciframos os sinais à nossa frente. Ainda agora os jornais estão repetindo, a propósito das recentes eleições, “que é preciso entender o recado das urnas”. Ou seja: as urnas falam, emitem mensagens. O sambista dizia que “as rosas não falam, as rosas apenas exalam o perfume que roubam de ti”. Perfumes falam. E as urnas exalaram um cheiro estranho. O presidente diz que seu partido precisa tomar banho de “cheiro de povo”. E enquanto repousava nesses feriados e tomava banho em nossas águas, ele tirou várias fotos com cheiro de povo.
Paixão de ler. Ler a paixão. Como ler a paixão se a paíxão é quem nos lê? Sim, a paixão é quando nossos inconscientes pergaminhos sofrem um desletrado terremoto. Na paixão somos lidos à nossa revelia.
O corpo é um texto. Há que saber interpretá-lo. Alguns corpos, no entanto, vêm em forma de hieróglifos, dificílimos. Ou, a incompetência é nossa, iletrados diante dele? Quantas são as letras do alfabeto do corpo amado? Como soletrá-lo? Como sabê-lo na ponta da língua? Tem 24 letras? Quantas letras estranhas, estrangeiras nesse corpo? Como achar o ponto G na cartilha de um corpo? Quantas novas letras podem ser incorporadas nesta interminável e amorosa alfabetização? Movido pelo amor, pela paixão pode o corpo falar idiomas que antes desconhecia.
O médico até que se parece com o amante. Ele também lê o corpo. Vem daí a semiologia. Ciência da leitura dos sinais. Dos sintomas. Daí partiu Freud, para ler o interior, o invisível texto estampado no inconsciente.
Então, os lacanianos todos se deliciaram jogando com as letras – a letra do corpo, o corpo da letra.
Portanto, não é só quem lê um livro, que lê.
Um paisagista lê a vida de maneira florida e sombreada. Fazer um jardim é reler o mundo, reordenar o texto natural. A paisagem pode ter sotaque. Por isto se fala de um jardim italiano, de um jardim francês, de um jardim inglês. E quando os jardineiros barrocos instalavam assombrosas grutas e jorros d’água entre seus canteiros estavam saudando as elipses do mistério nos extremos que são a pedra e a água, o movimento e a eternidade.
O urbanista e o arquiteto igualmente escrevem, melhor dito, inscrevem, um texto na prancheta da realidade. Traçados de avenidas podem ser absolutistas, militaristas, e o risco das ruas pode ser democrático dando expressividade às comunidades.
Tudo é texto. Tudo é narração.
Um desfile de carnaval, por exemplo. Por isto se fala de “samba enredo”. Enredo além da história pátria referida. A disposição das alas, as fantasias, a bateria, a comissão de frente são formas narrativas.
Uma partida de futebol é uma forma narrativa. Saber ler uma partida - este o mérito do locutor esportivo, na verdade, um leitor esportivo. Ele, como o técnico, vê coisas no texto em jogo, que só depois de lidas por ele, por nós são percebidas. Ler, então, é um jogo. Uma disputa, uma conquista de significados entre o texto e o leitor.
[...] Estamos com vários problemas de leitura hoje. Construímos sofisticadíssimos aparelhos que sabem ler. Eles nos lêem. Nos lêem melhor que nós mesmos. E mais: nós é que não os sabemos ler. Isto se dá não apenas com os objetos eletrônicos em casa ou com os aparelhos capazes de dizer há quantos milhões de anos viveu certa bactéria. Situação paradoxal: não sabemos ler os aparelhos que nos lêem. Analfabetismo tecnológico.
A gente vive falando mal do analfabeto. Mas o analfabeto também lê o mundo. Às vezes, sabiamente. Em nossa arrogância o desclassificamos. Mas Levi-Strauss ousou dizer que algumas sociedades iletradas eram ética e esteticamente muito sofisticadas. E penso que analfabeto é apenas aquele que a sociedade letrada refugou. De resto, hoje na sociedade eletrônica, quem não é de algum modo analfabeto? Vi na fazenda de um amigo aparelhos eletrônicos, que ao tirarem leite da vaca, são capazes de ler tudo sobre a qualidade do leite, da vaca, e até o pensamento de quem está assistindo a cena. Aparelhos sofisticadíssimos lêem o mundo e nos dão recados. A camada de ozônio está berrando um S.O.S , mas os chefes de governo, acovardados, tapam (economicamente) o ouvido. A natureza está dizendo que a água além de infecta, está acabando. Lemos a notícia e postergamos a tragédia para nossos netos.
É preciso ler, interpretar e fazer alguma coisa com a interpretação. Feiticeiros e profetas liam mensagens nas vísceras dos animais sacrificados e paredes dos palácios. Cartomantes lêem no baralho, copo d’água, búzios. Tudo é leitura. Tudo é decifração. Ler é uma forma de escrever com mão alheia. Minha vida daria um romance? Daria, se bem contado. Mas bem escrevê-lo são artes da narração. Mas só escreve bem, quem ao escrever sobre si mesmo, lê o mundo também.